Foi com perplexidade que me dei conta da recentíssima intervenção de dois ex-ministros da Saúde a propósito do caso das “gémeas brasileiras”: para eles, não há nada de anómalo no tratamento altissimamente privilegiado conferido a duas inocentes crianças brasileiras, naturalizadas portuguesas à pressa!

“Perante as perspetivas abertas, exige-se mais do que nunca, a objetividade do espírito cívico dos portugueses e toda a plenitude de um povo que quer e terá que assumir o seu destino”. Verdade há 50, verdade hoje.

A par da irregularidade das urgências, da incerteza da realização de consultas de rotina e exames complementares, o número de portugueses sem médico de família continua a ser um problema crónico.

Nunca gostei de gente sem conteúdo e o conteúdo não precisa de ser muito dramático ou eclético. A pessoa pode ser só um bom técnico, ou um talentoso e entusiasta horticultor.

Longe dos holofotes, as entidades da economia social protagonizam diariamente um trabalho insubstituível, com programas de intervenção que fazem o único chão de muitas vidas e abrem uma janela de esperança, deixando entrar horizontes onde se expressa um sentido de humanidade.

Se, por um lado, o BUPi foi uma inevitabilidade social ou necessidade emergente e resultante dos trágicos fogos florestais de 2017, por outro, o Cadastro Geométrico tardava em estender-se ao resto do território.

Se a maioria dos portugueses, seis em cada dez se alhearam da Europa e do projeto europeu abstendo-se, os líderes políticos não se interrogam? Era importante dar mais atenção a esta maioria silenciosa.

Sete anos depois dos trágicos incêndios, nem sequer o problema das comunicações foi resolvido; a gestão das florestas é uma soma de medidas avulsas, sem visão de conjunto, e o acesso à educação e saúde está longe do necessário.

Abrir mão de uma vida que nos mantém num nível de sofrimento “aceitável”, terá um alcance emocional incalculável. Será que justifica não arriscar? Por receio de trocar o certo pelo incerto?! SIM!! É preciso desistir!