O Tribunal Judicial de Leiria começa a julgar na quarta-feira 16 arguidos, entre os quais um militar da GNR, acusados de dezenas de crimes de tentativa de homicídio e ofensas à integridade física qualificada.
Segundo a acusação do Ministério Público (MP) a que a agência Lusa teve acesso, em conjunto, os arguidos, com idades entre os 22 e os 50 anos, cometeram dezenas de crimes.
Além dos crimes de homicídio qualificado na forma tentada e ofensas à integridade física qualificada, os arguidos vão responder ainda pelas acusações de exercício ilícito da atividade de segurança privada, falsificação de documentos, detenção de arma proibida, condução de veículo sem habilitação legal, abuso de poder, favorecimento pessoal praticado por funcionário, ameaças agravadas, coação agravada e violência doméstica.
Os factos remontam a 2012 e 2013 e incidem em várias situações de agressões: muitas delas, segundo o MP, verificaram-se “sem qualquer razão minimamente explicável” e “pelo prazer de espancar alguém”.
De acordo com o despacho de acusação, no dia 13 de outubro de 2012, junto a uma discoteca no centro de Leiria, quatro arguidos acordaram ferir um homem. O arguido, militar da GNR, não uniformizado, ficou a vigiar a chegada de forças policiais.
Quando a vítima passou junto dos quatro arguidos, estes “desferiram-lhe simultaneamente múltiplos murros e pontapés no corpo, onde o apanhavam, o que o fez cair no chão indefeso”.
Duas raparigas tentaram evitar que as agressões continuassem, acabando também por ser vítimas.
“Querendo atuar todos simultaneamente, na sequência de plano previamente delineado (…) numa atuação despropositada e sem sentido perante o senso comum, totalmente irrelevante na adequação do facto, radicando num egoísmo mesquinho e insignificante”, lê-se na acusação.
No dia 01 de dezembro de 2012, em Caldas da Rainha, outros dois arguidos agrediram com “múltiplos murros e pontapés no corpo” um indivíduo por ter apresentado propostas para efetuar segurança em vários estabelecimentos noturnos desta cidade, a preço inferior praticados pela empresa Lexsegur, atualmente extinta. No mesmo dia, outro arguido tinha ameaçado a vítima e a sua família.
Na noite de 12 para 13 de março de 2013, num estabelecimento de diversão noturna da cidade de Leiria, dois arguidos perguntaram a um cidadão para onde estava a olhar e ameaçaram-no, chamando-lhe “preto”. O jovem ligou ao pai, que, “dada a sua compleição física”, impediu que o filho fosse agredido.
Numa paragem de autocarro junto ao bar, os arguidos acabaram por agredir o homem. Os arguidos “quiseram atuar sem qualquer razão minimamente explicável, pelo prazer de espancar alguém e lhes causar dor e sofrimento”, bem como “exercer violência física contra alguém apenas pela sua cor e origem étnica”, refere o MP.
Pouco depois, outros arguidos foram avisados que o grupo estaria “à porrada” e acorreram ao local, voltando a agredir o homem que tinha ido em socorro do filho. Quando se aperceberam que a vítima se “esvaía em sangue e inconsciente”, puseram-se em fuga.
O homem foi transportado para o hospital de Leiria. Como eram vigilantes no Centro Hospitalar de Leiria “conseguiam estar por perto”, lê-se na acusação. Um dos arguidos “conseguiu atrasar o transporte” da vítima para o hospital de Coimbra, o que “possibilitou” a outro acusado “entrar na área reservada” onde o ferido se encontrava e ameaçá-lo para não apresentar queixa. “Caso contrário, vingavam-se no seu filho, este seria atacado e que a Terra não era suficientemente grande para se esconder”.
O despacho de acusação do MP relata ainda mais dez agressões e várias ameaças que aconteceram até ao verão de 2013. Numa destas agressões, os arguidos voltaram a aceder às urgências do hospital de Leiria e na zona da triagem uma das vítimas foi abordada por três homens, sendo agredido e ameaçado de morte.
A vítima “viu-se forçada a fugir para dentro da zona das urgências do hospital”.
Para o julgamento, o MP requer que as testemunhas “no momento de prestação de declarações ou depoimento decorra com ocultação da imagem e com distorção da voz, com recurso à videoconferência, de modo a evitar-se o reconhecimento”.
É também solicitado que seja limitado o acesso ao local da prestação do depoimento, que as testemunhas tenham “assegurado transporte em viaturas fornecida pela PSP” e que exista um “compartimento vigiado e com segurança, nas instalações judiciárias ou policiais a que tenha de se deslocar e no qual possa permanecer sem a companhia de outros intervenientes no processo”.
Estas medidas foram exigidas, com base na informação da PSP, que indicou uma “real probabilidade dos arguidos cometerem eventos contra testemunhas ou seus familiares, exercendo pressão ou ameaça (…) com o objetivo de condicionar o seu depoimento”.