Última prova internacional do árbitro leiriense realizou-se em Glasgow, Escócia, de 14 a 17 de junho de 2018 Foto: UEJ
Arbitrou durante 15 anos ao mais alto nível e atingiu o que mais ninguém conseguiu em Portugal. Carlos Duarte, o único árbitro português a apitar nos Jogos Olímpicos e nos Jogos Paralímpicos, participou pela última vez numa prova internacional de judo. Treze anos depois de ter deixado as provas internacionais, a União Europeia de Judo (UEJ) convocou-o. A chamada confundiu o árbitro mas, como sempre o fez, mostrou-se disponível para fazer aquilo que tanto gosta e foi surpreendido.
“Ao fim de 13 anos achei estranho estarem a convocar-me, mas também era a minha última oportunidade de apitar um campeonato da Europa. Tinha parado a minha carreira internacional em 2005, devido a questões pessoais e profissionais, mas continuei a fazer provas em Portugal. Como há três delas que contam para a classificação internacional, fui apanhado”, disse. Tudo porque o árbitro que começou a apitar em 1979 completou 66 anos este mês de junho e a idade limite são os 65 anos. No final da competição, foi homenageado pela UEJ, assim como o o juiz sueco Dick Johasson’s.
A participação teve outra curiosidade. Em centenas de eventos internacionais em que ajuizou – campeonato do mundo e europeus de seniores e juniores, Grand Slam de Paris onde esteve 13 vezes seguidas, torneio em Berlim,… – Carlos Duarte (6º Dan) estreou-se no Campeonato da Europa de veteranos. A prova com mais de 1.400 atletas aconteceu na Emirates Arena em Glasgow, Escócia, entre os dias 14 e 17.
“É tão ou mais exigente que os seniores. Há atletas da minha idade, e alguns jovens, a partir de 30 anos, com uma qualidade muito alta e intensa. Foi difícil arbitrar, porque já estava afastado há muito tempo, faltava ritmo… E a idade também já pesa”, brincou o membro da Comissão de Arbtragem da Federação Portuguesa de Judo.
E em Portugal, também será homenageado? “Conhece o ditado ‘Santos da casa não fazem milagres’? Para mim sempre foi mais fácil o reconhecimento lá fora, pelos selecionadores e atletas. Não sei se a Federação o vai fazer. Prejudiquei-me muito pessoal e profissionalmente para chegar onde cheguei e acho que, apesar do meu esforço, nunca tive o devido reconhecimento da Federação”, lamenta.
Entre os melhores
A ligação ao judo começou quando veio fazer a tropa em Leiria. Natural de Viana do Castelo, começou a praticar e adotou a cidade do Lis para não mais sair. Presidente do mais antigo clube de judo de Leiria, Clube Judo do Dragão, com 42 anos de atividade, hoje, já reformado, dedica-se a tempo inteiro aos treinos dos 140 jovens atletas que representam o emblema.
A escolha pela arbitragem surgiu naturalmente na carreira do atleta e treinador. “No judo, para se ser árbitro é obrigatório ser praticante e ter determinada graduação, cinto castanho ou negro. Ser árbitro era também uma forma de estar ligado à modalidade e podia ter as várias funções. Quando fui para o conselho de arbitragem, acabei com isso. Não fazia sentido, ir aos campeonatos nacionais, estar a arbitrar um jogo e a ser insultado por um treinador e a seguir despia o casaco, passava a treinador e ia orientar o meu atleta e protestar com outro árbitro. Eu acabei com isso”, refere, orgulhoso e confiante que a alteração ajudou a melhorar a modalidade.
Indissociável ao percurso está a participação nos Jogos Olímpicos de Atenas (2004), onde apitou a final de -66 kg. “Fomos 25 árbitros de todo o mundo aos Jogos e só 14 é que arbitraram finais. Eu fui um deles. É realmente o momento mais alto que uma pessoa pode ter na carreira”, afirma. No entanto, foram os Jogos Paralímpicos, quatro anos antes, em Sidney, que mais o marcaram. “Uma pessoa está à espera de uma competição limitada e, de repente, percebe que apesar de cegos ou surdos, os atletas descobrem outros sentidos que os fazem competir a um nível muito elevado. É impressionante a capacidade que os paralímpicos têm para competir”, lembra.
A experiência acumulada ao longos dos últimos 40 anos vai continuar a marcar presença nos tatamis nacionais. “Faço parte do conselho de arbitragem, continuo a observar árbitros e a descobrir novos talentos. Tenho que encontrar alguém que me substitua nos Jogos Olímpicos. Gostava que outros também o conseguissem”, considera Carlos Duarte que voltaria a repetir todo o percurso desportivo. “Nunca imaginei, nem nos sonhos mais maravilhosos, ir ao Jogos Olímpicos e fui”, conclui.
Marina Guerra
Jornalista
marina.guerra@regiaodeleiria.pt
(Artigo publicado na edição de 28 de junho de 2018)