“Pelotão… Formar…”, “Pelotão, bater asas”. Não sabemos comunicar com as abelhas nem se é através de ordens militares que as criadoras do mel no Japão estão a conseguir contrariar a entrada das vespas asiáticas nas colmeias. Mas tem sido pelo bater das asas que a “praga” da vespa de patas amarelas, como também é conhecida, a vespa velutina, tem sido combatida a Oriente.
Quando a vespa entra na colmeia, as abelhas conseguem subir ou descer a temperatura de uma colmeia de forma natural com o bater de asas e toleram temperaturas até 44º graus centígrados. Já a vespa, com o dobro do tamanho, mandíbulas, e um ferrão que dura toda a vida, morre quando a temperatura chega aos 43º graus. O combate parece fácil de fazer mas o processo demorou algum tempo até começar a ter efeito no Japão.
Por cá, as abelhas portuguesas ainda não praticam este exercício de asas e a presença de vespa asiática começa a ganhar dimensão na região.
Os primeiros avistamentos da espécie exótica invasora foram registados em Portugal em 2011. No distrito de Leiria, os primeiros dados reportam a 2015 e até janeiro de 2018, foram identificados seis ninhos de vespa asiática, segundo o Plano de Ação para a Vigilância e Controlo da Vespa velutina em Portugal.
O cenário, agora, é bem diferente. No ano de 2018, a plataforma SOS Vespa identificou 169 ninhos, 78 dos quais nos últimos três meses. O panorama é idêntico no concelho de Ourém: 28 ninhos e 6 avistamentos registados em 2018, 29 dos casos no último trimestre de 2018.
A propagação da espécie pelo território nacional têm aumentado a cada mês, de norte para sul, e a região de Leiria começa a ser engolida por este vespeiro de patas amarelas.
As autarquias têm trabalhado com corporações de bombeiros ou empresas especializadas na remoção dos ninhos, sempre que algum caso é identificado, casos de Ourém e Marinha Grande.
No concelho de Leiria, nos últimos três meses, a autarquia eliminou 90 ninhos de vespas asiáticas, revelou a vereadora Ana Esperança, na passada terça-feira, em reunião de executivo.
Dados referentes ao final do ano de 2018, segundo a autarquia, davam conta de um registo maior de casos na União de Freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes e na União de Freguesias de Colmeias e Memória.
Álvaro Madureira, vereador do PSD da Câmara de Leiria, questionou a maioria quanto à eficácia do combate a esta espécie
Considerando tratar-se de um “problema económico, ambiental e de segurança”, sugeriu entre outras medidas a realização de sessões de esclarecimento nas freguesias, o aumento de meios e equipas especializadas, a produção de relatórios mensais e criação de uma base de dados com georreferenciação da localização destes ninhos.
Apesar de não ser “individualmente mais agressiva para o ser humano do que a vespa europeia”, a espécie “reage de forma bastante agressiva às ameaças ao seu ninho”. Por exemplo, “perante uma ameaça ou vibração a cinco metros”, o vespeiro “produz uma resposta de grupo que pode perseguir a fonte da ameaça durante cerca de 500 metros”, explica Carlos Guerra, comandante operacional distrital da Proteção Civil.
O tamanho da vespa asiática, mais do dobro da abelha, também pode assustar.
Quebra na produção
Em Pombal, a autarquia procedeu à aquisição de material próprio para a remoção de ninhos. Quando alertado, uma equipa de Sapadores florestais, desloca-se ao terreno para validação de cada comunicação rececionada. “Simultaneamente é realizada uma análise individual dos ninhos, considerando o perigo potencial para a população, humana e apícola”, explica o município.
Pombal é o concelho da região com mais casos identificados em 2018. Seguem-se Castanheira de Pera, Ansião, Pedrógão Grande e Alvaiázere e Leiria, mas estes números alteram todos os dias na plataforma SOS Vespa.
No entanto, muitas das situações não ficam registadas. Por exemplo, quando em dezembro passado, o REGIÃO DE LEIRIA elaborou este trabalho, a Câmara de Leiria referia a existência cerca de 50, quando a plataforma só mencionava três casos.
Na Marinha Grande não aparecia nenhum mas a autarquia dava conta de nove e, na semana passada, emitiu num comunicado identificando 12 ninhos. Ou seja, o número será bem superior.
Em Pombal, a “grande maioria [dos ninhos] está em árvores, sendo a localização mais comum. Também foram reportados casos da existência de ninhos em alguns anexos de habitações e, num caso particular, numa toca, no chão”, referiu a autarquia, acrescentando que 38 foram destruídos.
Mas se não existe um perigo direto para os humanos, no caso da apicultura, o impacto é muito maior. Um exemplar da vespa velutina pode matar mais de 30 abelhas por minuto. Informação divulgada pela Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), refere que se um grupo de cinco entrar numa colmeia, pode matar milhares em apenas uma hora.
A presença deste predador, informa a Associação de Apicultores da Região de Leiria, Ribatejo e Oeste (AARL), aumentou no período do verão e outono. “O apicultor está obrigado a diferentes técnicas de maneio assim como a gastos suplementares com alimentação, materiais e iscos para armadilhas, deslocações suplementares ao apiário para dar assistência às abelhas. Além disso, a pressão/predação pode fazer baixar a produção em cerca de 15%. Estimamos que os custos por colmeia se situem nos 12 euros”, salienta a direção da AARL.
Outra consequência indireta traduz-se na diminuição das atividades das abelhas e num enfraquecimento e morte da colmeia, o que gera uma menor produção de mel e produtos relacionados e uma diminuição da polinização vegetal. Com menos atividade polinizadora, também a produção agrícola é afetada.
Sendo uma espécie não indígena, predadora natural das abelhas e outros insetos, a médio prazo, explica a DGAV, podem existir “impactos significativos na biodiversidade, em particular nas espécies de vespas nativas e nas populações de outros insetos”.
Apesar do cenário parecer catastrófico, enquanto as abelhas nacionais não batem as asas para afugentar as vespas, podemos contar com os fatores climáticos.
Segundo a AARL, “embora a região tenha condições ideais para o desenvolvimento da vespa velutina, como temperatura, humidade e zonas de floresta, o nosso calendário florístico está em contra ciclo com o ciclo biológico da vespa. Temos florações de outono/inverno principalmente de eucalipto, que produz muito néctar e pólen, o que permite o desenvolvimento e alimentação dos enxames e alguma produção de mel numa altura em que a vespa reduz população e hiberna”.
Frio e chuva em excesso, tal como o bater das asas, podem ser determinantes nos próximos anos.
Marina Guerra
Jornalista
marina.guerra@regiaodeleiria.pt
Martine Rainho
Jornalista
martine.rainho@regiaodeleiria.pt
(Artigo publicado a 6 de dezembro de 2018, com atualização dos dados referentes ao ano de 2018 e introdução da informação divulgada pelas Câmaras de Marinha Grande e Leiria)
São mais de duas centenas as ocorrências registadas na plataforma SOS Vespa em 2018. Números deverão ser superiores, pois nem todos os casos estão a ser registados no portal. Só no distrito de Leiria 60 dos 197 casos foram sinalizados em outubro e novembro.
Vespa asiática (velutina)
No ano de 2018 foram identificados 197 ninhos no distrito de Leiria e concelho de Ourém. Foram assinalados ainda 19 avistamentos.
Vespa europeia (crabro)