É como se Messi, Ronaldo, mas também Ronaldinho Gaúcho e até Zidane se juntassem para jogar, dar umas aulas e mostrar uns truques em Alcobaça: o festival Gravíssimo! é isso, mas dedicado aos metais graves. Ou seja, às tubas, aos trombones e aos eufónios.
Mais de duas dezenas de convidados de todo o mundo juntam-se na cidade entre 26 e 30 de agosto para concertos, masterclasses e workshops. À nona edição, o Gravíssimo!, organizado pela Banda de Alcobaça/Academia de Música de Alcobaça, transformou-se na “Meca” dos metais graves.
“Festivais só focados nos metais graves não há muitos no mundo”, garante o tubista Sérgio Carolino, que divide a direção artística do festival com o trombonista Hugo Assunção.
Há quase uma década, ambos decidiram transformar uma proposta de workshop num festival que, este ano, atrai mais de 80 participantes – a maioria espanhóis – e os maiores especialistas mundiais nestes instrumentos que ainda são estranhos para muitos, quando ouvidos por si só: os metais graves.
“O crescimento tem sido passo a passo”, conta Sérgio Carolino, reconhecendo maior ambição nos últimos anos, sobretudo após o reconhecimento e apoio da DGArtes.
“Só com isso, o apoio da Yamaha Europa e as amizades que tenho, tem sido possível trazer tantas estrelas cá. Quando demos por ela tínhamos um festival internacional. Nunca pensámos que chegava ao ponto a que chegou”, sublinha o músico de Alcobaça, com vasta carreira no estrangeiro.
É exatamente a notoriedade conquistada internacionalmente pelo tubista de Alcobaça que permite ao Gravíssimo! chegar ao patamar em que está:
“Toco com muitos destes músicos em vários festivais e é assim que os consigo trazer. Claro que também acreditam no projeto em si”, encarando a participação com uma atitude especial.
É que, se por um lado, o Gravíssimo! é “muito eclético”, apresentando “todo o tipo de música ligada aos metais graves”, por outro “as pessoas que cá vêm são escolhidas a dedo e isso torna o festival muito especial”.
“Têm todos uma filosofia de vida muito específica”, explica Sérgio Carolino, acrescentando que isso resulta “num ambiente que mexe muito com Alcobaça”.
Por estes dias, todos os participantes, sejam eles alunos, professores ou músicos convidados, misturam-se numa confraternização pouco habitual em realizações semelhantes:
“À noite os professores deixam de ser professores, não há diferenças com os alunos. Todos ficam ao mesmo nível e há um ambiente especial”.
O crescimento do festival está, contudo, até a causar problemas à organização: “Faltam espaços para fazer concertos e exposições. Estamos um pouco limitados para um evento que precisa de muitas salas”.
Sérgio Carolino tem esperança que, após a conclusão do hotel no Mosteiro e de ser tornado real o projeto de um pavilhão multiusos em Alcobaça, haja condições para levar o festival mais longe. “Mas até as coisas estarem concluídas, estamos um pouco condicionados”.
Enquanto isso não acontece, admite-se que o programa se estenda a outros locais. Este ano, por exemplo, Leiria recebeu o concerto de abertura e promoção de Gravíssimo!, na Igreja da Misericórdia. “Ir até Leiria ou Caldas da Rainha implica muita logística”, sublinha, mas, “se unirmos forças, todos ganham”.
“O país ainda vive muito à base de ‘capelinhas’. As pessoas querem todas ter protagonismo e destaque só para si e isso e não faz sentido. Estamos a tentar não seguir esse caminho”, acrescenta.
Este ano, Gravíssimo! vai bater recordes de participação e Sérgio Carolino antecipa “uma semana espetacular e inesquecível. Vamos sair daqui todos mais ricos e aprender imenso”.
Afinal, por estes dias vão estar em Alcobaça nomes como Robin Eubanks, “um dos nomes sonantes do trombone nos últimos 20 ou 30 anos”, os tubistas das orquestras de Chicago e Nacional de Espanha e da Filarmónica de Munique, o antigo tubista da Orquestra de São Francisco, além de Ricardo Mollá, “um trombonista compositor e solista internacional”, François Thuillier, “um tubista francês fantástico”, ou Anthony Caillet, “dos eufonistas mais virtuosos a nível mundial”.
Mas, mesmo com tantas estrelas, Sérgio Carolino não esconde a frustração:
“Fico apreensivo: trazemos os suprassumos nesta área e a maior parte dos participantes [alunos] são espanhóis… Há qualquer coisa no nosso país que tem vindo a falhar, e vejo aqui pelo Gravíssimo!: muitos portugueses não aparecem quando há estas oportunidades. Há tantos jovens portugueses a estudar metais graves e muitos não vêm. Faz-me pensar sobre o que esta gente pretende fazer na vida e que objetivos têm. Se gostam, são apaixonados pelo que fazem…”. E não é pelo preço: participar nos cinco dias custa cem euros e dá direito a masterclasses, conferências, dois concertos por noite com estreias de obras de compositores residentes e contactos com as principais marcas de instrumentos. “Assim, não há em mais lado nenhum. Bom, não se percebe”, desabafa.
Já o público de Alcobaça parece rendido aos metais graves. “Temos tido sempre as salas esgotadas”, nota o músico.
Apesar de andarem longe de ser instrumentos mainstream, as tubas, trombones e eufónios já entraram nos hábitos audiófilos dos alcobacenses.
“As pessoas gostam de ouvir”, realça Sérgio Carolino, atribuindo essa prática e curiosidade a anos de Cistermúsica e, mais recentemente, de Concurso Internacional de Música de Câmara.
“Cá tem havido sempre bons músicos e as pessoas dão valor. Para o tamanho da terra e para as condições que temos – em termos de salas de espetáculo – é quase inimaginável acreditar que isto se passa tudo em Alcobaça”.
Para o público habitual ou curiosos, Gravíssimo! tem concertos nos finais de tarde e noites, todos os dias, até 30 de agosto, em espaços como o Mosteiro de Alcobaça, Museu do Vinho ou Cine-Teatro.
Espetáculos