A presidente da Associação Folclórica da Região de Leiria – Alta Estremadura, Ana Rita Leitão, aposta na organização de uma edição da Europeade na região
Deu os primeiros passos no folclore aos 11 anos, dançando no Grupo Típico de Ançã, vizinho da Cidreira natal, no concelho de Coimbra. Aí começou um percurso determinante para a sua vida e que a levou, na última década, a integrar a direção da Federação do Folclore Português. Há três anos, por motivos profissionais, Ana Rita Leitão mudou-se para Leiria. Faz parte do Rancho Folclórico Luz dos Candeeiros, do Arrimal, no concelho de Porto de Mós. No final de 2019 foi eleita presidente da direção da Associação Folclórica da Região de Leiria – Alta Estremadura (AFRLAE), para um mandato de dois anos.
Chega à presidência da AFRLAE substituindo Adélio Amaro que teve uma ação marcante. É uma herança pesada?
Foi muito marcante e é uma herança pesada. Recebo a associação nos píncaros, com uma casa nova. Receio não estar à altura do lugar, sobretudo pelas expectativas dos associados. Nos últimos dois anos foi criada uma rede de interligação e aproximação entre os sócios que é muito positiva.
O que deseja para este mandato?
Desde logo, continuar o “Falando de etnografia”. Além de serem momentos de reflexão muito dinâmicos, são descentralizados e congregadores. O segundo grande evento será a recriação histórica, com o município de Leiria. Estamos a desenvolver o modelo. É um momento muito importante para os nossos ranchos. Os que participam neste e noutros, momentos da agenda cultural de Leiria, dão uma imagem muito digna do folclore da região. E é uma mais-valia em termos económicos e de dinâmica de grupo. O terceiro grande evento será a 10 de outubro: a gala de tributo aos folcloristas da Alta Estremadura, no Teatro José Lúcio da Silva. Será um dia em que os grupos serão convidados e haverá lugar a distinções. É um desafio grande e queremos que seja diferenciador.
A associação tem 44 grupos sócios. A perspetiva é crescer?
É alargar tanto quanto possível. Mas estamos bem. Queremos sobretudo que os nossos sócios estejam satisfeitos. Se vierem mais, melhor. É importante estar próximo destes 44 e perceber o que podemos fazer para melhorarem.
Quarenta e quatro são muitos sócios. A associação devia ter mais reconhecimento e força?
É importante haver consciência cívica, perceber a sua importância e que o associativismo cultural é um oásis de cidadania, porque é algo tendencialmente gratuito que se faz para preservar a memória coletiva. Essa consciência nem toda a gente a tem, nem mesmo alguns folcloristas e membros do movimento.
Qual a maior força e a maior fraqueza da etnografia da Alta Estremadura?
A identidade. Temos um território que nos identifica. Esta identidade, este património, esta memória coletiva, não é cristalizada como os etnólogos defendiam, mas é a que não cria exclusão social. É uma memória presente, que se vai reinventando na proximidade com os públicos. O grande desafio é não deixar que essa nossa memória se turistifique até perder a sua identidade. Este território é grande, de Pombal a Peniche ou de Ourém à Vieira, mas é coeso. Essa é a mais valia desta associação.
Na Federação organizou o Encontro Nacional de Jovens Folcloristas que juntou em Mira de Aire juntou mais de 400 jovens e mostrou que os ranchos não são só gente com mais idade…
Sim, mas esta proximidade com os jovens deixou-me mais certezas em relação às pessoas mais velhas e algum medo em relação às “pessoas de sapatilhas”. Os mais velhos são teimosos, sim, mas sabem o que a vida custa, já passaram por tanto e querem que tudo isto continue. Vi muito mais arrogância nos jovens. O que se vê muito é que há gente que se chega aos grupos com espírito de rutura. Mas não se pode entrar com esse espírito num projeto que é comunitário. É incongruente.
Essa experiência, ou o projeto de Salvaguarda das Danças Tradicionais Portuguesas de Porto de Mós, promovido pelo Politécnico de Leiria com a Federação, o município e AFRLAE, pode ajuda-la no cargo?
O projeto de investigação da professora Marisa Barroso e da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais de Leiria permitiu aos grupos salvaguardarem, em forma de registo, as suas danças. Falta ainda uma monografia deste projeto, que está para breve. Dependendo da dinâmica que a professora Marisa quiser dar ao projeto-piloto, nós queremos estar ao lado. Gostávamos muito de o alargar aos nossos associados. Não nos mesmos moldes, porque são 44 ranchos e, por exemplo, em Leiria, onde temos 17 associados, seria complicado. Mas se a Rede Cultura quiser ser um impulsionador do projeto, era uma grande conquista para a etnografia da Alta Estremadura. Era uma revolução coperniciana! Era muito gratificante ver todo o estádio de Leiria dançar um fado estremenho!
Com que conquistas gostava de chegar ao fim do mandato?
O tempo dos ranchos folclóricos atuarem para as outras pessoas passarem já lá vai. Estamos ao serviço sim, mas como participantes. Isto sublinha-se na recriação histórica em Leiria e noutras atividades para que somos desafiados. No mandato anterior, o Adélio Amaro falou no desejo de Leiria ser capital do folclore, acolhendo a Europeade [festival de música folk]. Participei, pelo grupo de Ançã, em cerca de dez edições e sei que as Europeade são momentos de partilha, paz e alegria, assentes na cultura popular dos países da União Europeia. Sosseguem os céticos: não são folclore cristalino. Também envolvem coros e filarmónicas. Temos espaços que podem bem servir para os encontros, como as praças de touros de Abiul ou Nazaré, a marginal da Nazaré ou junto ao Mosteiro da Batalha. Até 2025 as cidades estão escolhidas e tem de ser um município a avançar na organização. A anterior direção falou com o município de Leiria e continua a haver esse desejo. É um projeto diferenciador, que traz muita gente e dá protagonismo aos nossos associados. Vamos continuar a trabalhar para isso.
ML