Nestes dias passados por casa, cumprindo o isolamento social imposto pela pandemia da covid-19, as televisões e páginas de internet foram invadidas por informação sobre o novo coronavírus. Mas entre balanços numéricos e medidas de prevenção, há espaço para histórias de esperança e sobrevivência.
É o caso do momento que Afonso Castanheira viveu na manhã deste domingo, dia 5, na praia da Almagreira, em Peniche.
O músico e surfista passeava os seus três cães pela praia, enquanto aproveitava para cumprir a habitual “corridinha” da manhã, quando viu um rapaz a tentar colocar dentro de água um golfinho que tinha dado à costa.
Prontamente se propôs a ajudar e, depois do rapaz ir embora, resolveu ficar de vigia a tentar perceber se o golfinho tinha seguido o seu caminho com sucesso.
“Resolvi ficar a ver o golfinho durante um bocado e foi quando apareceram outros dois. O golfinho acabou por voltar a querer vir para a areia”, conta Afonso Castanheira ao REGIÃO DE LEIRIA.
Foi nesse momento que o músico, conhecido por Sea Groove, decidiu entrar na água para ajudar o golfinho que “estava completamente desorientado”. Já dentro do mar, percebeu que o animal estava ferido, “cheio de riscos na testa e no dorso, com sangue”.
Os outros dois golfinhos também estavam feridos. “Tinham cortes muito feios e a um deles esses ferimentos estavam a afetar a orientação”, explica.
Para o ajudar, Afonso Castanheira nadou “um bocadinho com ele [golfinho desorientado] para longe da areia” e os outros dois animais acabaram por se juntar. Depois de o libertar, os golfinhos “nunca mais voltaram”.
O artista que reside no Baleal, em Peniche, resolveu regressar mais tarde, quando o mar já se encontrava numa fase de maré vazia – altura em que os animais poderiam dar de novo à costa – e verificou que eles não tinham regressado. Mesmo no dia seguinte, continuava tudo normal.
Apesar da agitação marítima e das temperaturas baixas pelas quais, por vezes, aquela zona é conhecida, esses fatores não demoveram Afonso Castanheira que já vive no Baleal há oito anos e, por isso, conhece bem a zona.
“Faço surf, gosto de andar de barco, por isso conheço muito bem a zona e sei onde estão as rochas. Nem a temperatura me faz confusão”, acrescenta.
Explica que a “adrenalina era tanta” que entrou com a roupa que trazia vestida e sentiu “um ardor no coração”.
O facto da maré estar a subir e o mar estar “muito calminho” também contribuiu para o sucesso do salvamento.
Ligação à natureza é a grande lição
Para Afonso Castanheira, o momento que viveu na praia de Almagreira é uma forma de ligação com a natureza, algo que “cada vez tem de se ter mais, senão virão mais coronavírus” no futuro.
O artista conta que tem recebido várias mensagens depois do assunto ter sido notícia em diversos órgãos de comunicação social e “muitas delas referem o facto de ser, finalmente, uma notícia positiva a fechar os telejornais e que precisamos mais destas coisas”.
Apesar de estar a cumprir o isolamento social com a “vantagem de viver virado para o mar e com três cães” que passeia todos os dias, não pode ir “ter com ninguém para beber um copo ou comer num restaurante”, o que é uma dificuldade transversal a qualquer um.
A aproveitar a “frescura” que o ar da praia e o mar lhe dão todos os dias, Afonso Castanheira acredita que as pessoas podem sair do isolamento social “mais abertas umas com as outras, sem tantas fronteiras, nem tantas guerras”.
No entanto, assegura, “é a responsabilidade de cada um ter essa iniciativa”, colocar essa questão e agir para a mudança.