A ação popular que opõe a Associação Salvador ao Ministério da Justiça e Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ), devido aos problemas de acessibilidades para deficientes no Tribunal Judicial de Leiria, aguarda marcação da audiência prévia.
“A ação judicial da Associação Salvador foi instaurada no dia 11 de fevereiro de 2019 [no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria], só um dos réus é que contestou e, decorridos quase dois anos, ainda não existe data para a realização da audiência prévia”, refere uma resposta escrita da associação enviada à agência Lusa.
Em 30 de janeiro de 2019, a associação, que apoia pessoas com deficiência motora, anunciou que iria processar o Tribunal de Leiria por este não ter acessibilidades para deficientes.
“Chegámos ao ridículo de termos de ‘colocar um tribunal em tribunal’ porque a falta de acessibilidades do nosso país é real e uma falta de respeito por todos nós”, afirmou na ocasião o presidente da associação, Salvador Mendes de Almeida.
Na informação enviada agora à Lusa, a Associação Salvador explica que a ação foi instaurada “com a finalidade obrigar” o Ministério e o IGFEJ “a realizarem intervenções concretas nos edifícios do Tribunal Judicial de Leiria”, para cumprir a legislação.
“E, obviamente, por consequência, deixar uma marca a nível nacional de que as acessibilidades são realmente um problema, sendo um dos principais fatores de exclusão social das pessoas com deficiência motora”, adianta.
A associação refere que inicialmente o Ministério Público (MP) defendeu que a ação popular administrativa de condenação à adoção de comportamentos pela Administração Pública “estava destinada ao insucesso”, alegando “falta de competência” do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) para a apreciar.
Alegou ainda o MP que “a legislação sobre as normas técnicas de acessibilidade não são de aplicação imediata pelo Estado“, pois “estão inseridas na função política do governo onde preside uma larga margem de discricionariedade em função de múltiplos fatores”, e “não existem quaisquer violações do princípio da igualdade, do direito à qualidade de vida, nem violação do direito de acesso ao Direito e aos tribunais”.
O TAF de Leiria admitiu, no entanto, a ação, tendo chamado o Ministério da Justiça e o IGFEJ para a contestarem, e conferiu “a todas as pessoas portadoras de deficiência motora residentes em Portugal o direito de se juntarem à causa defendida pela Associação Salvador na ação”, acrescenta.
Ao pronunciar-se sobre a contestação do IGFEJ, o MP reconhece que os objetivos do diploma que aprova o regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, de 2006, “além de não terem sido cumpridos no prazo aí previsto, não há qualquer certeza de quando isso possa vir a suceder, por depender de vários circunstancialismos”, nomeadamente económicos e financeiros, que condicionam a atuação da Administração Pública.
A Associação Salvador contrapôs que “ao permitir que o cumprimento das normas de acessibilidade esteja condicionado por opções políticas, económicas ou por um juízo de oportunidade da Administração Pública, está a efetuar-se uma interpretação completamente contrária à lei”.
Ainda de acordo com a associação, nos termos daquele diploma “as normas de acessibilidade são de aplicação imediata nos edifícios do Tribunal de Leiria e, caso a Administração Pública defenda que o cumprimento das normas técnicas de acessibilidade não é exigível naquele tribunal, tem de fundamentar o seu não cumprimento”.
Na mesma resposta à Lusa, a associação informa que em novembro de 2019 foi notificada da decisão de intervenção de pessoas que manifestaram interesse em participar na ação popular, sendo o passo seguinte a audiência prévia, com as partes.
Em setembro de 2020, o processo transitou para outro juiz que no mês seguinte comunicou que “o agendamento da audiência prévia ficaria sem data marcada, uma vez que o juiz está a tratar de processos dos anos de 2015 e seguintes, que também necessitam de marcação de audiência prévia e que sendo aqueles processos mais antigos, têm prevalência sobre o processo da Associação Salvador”, explica esta entidade.
A Associação Salvador reitera que considera “inadmissível a situação”, notando que, como o Tribunal Judicial de Leiria, “existem muitos outros que não têm qualquer acessibilidade”.
“Teremos de esperar mais 20 anos para caminharmos para um país mais acessível?” questiona a associação, considerando “urgente” a revisão do diploma de 2006, como é urgente a fiscalização e “uma postura ativa na área das acessibilidades pelas entidades que são responsáveis”.