A indústria de moldes atravessa um período difícil, em resultado de diversos problemas mundiais, entre os quais sobressaem a pandemia e a desaceleração das encomendas do seu principal cliente, o sector automóvel. Estas e outras questões estiveram em debate na Semana de Moldes 2021, que vincou, mais uma vez, a capacidade de reinvenção e agregação do sector, um dos principais embaixadores da indústria portuguesa no mundo.
Esta ideia foi vincada na sessão de encerramento pelo secretário de Estado da Internacionalização, Eurico Brilhante Dias: “O sector dos moldes sempre foi muito aberto ao exterior, fortemente exportador e teve um crescimento progressivo das suas exportações até ao momento, muito particular, em que a transição energética colocou desafios à mobilidade e ao sector automóvel”.
Em termos nominais, o melhor ano de exportações foi 2017, o saldo mais positivo entre importações e exportações aconteceu em 2018 e a melhor taxa de cobertura anual registou-se em 2019. Este ano, a manterem-se os resultados alcançados até setembro, o sector pode alcançar em 2021 a melhor taxa de cobertura dos últimos anos.
Saldo positivo
Para o secretário de Estado da Internacionalização, estes dados significam que “a relação entre exportações e importações de moldes poderá superar os 355 ou 356%, ou seja, o valor das exportações é quase 3,6 mais do que o alcançado pelas importações. É um valor assinalável, fazendo do sector um contribuinte líquido para a balança comercial, gerando um saldo fortemente positivo”.
Um dos desafios que a indústria tem pela frente é o da diversificação. As exportações estão concentradas em mais de dois terços [74%], no sector automóvel, apesar dos movimentos de diversificação para as áreas dos dispositivos médicos, aeronáutica – também a enfrentar grandes desafios -, bens da eletrónica de consumo, têxteis ou calçado. O governante diz-se “defensor da diversificação, do aumento relativo dos outros sectores clientes, mas não se pode esquecer que o automóvel tem e continuará a ter um papel central”.
“Quanto à transição energética, não é sequer uma grande novidade pandémica. Desde 2017 até hoje o sector tem tido grandes dificuldades em retomar um processo de crescimento das exportações. O que o Governo e a indústria têm de fazer em conjunto é uma aproximação aos mercados construtores de automóveis, sobretudo o francês, alemão e espanhol”, referiu Eurico Brilhante Dias, que falava na sexta-feira, dia 26, no último dia da Semana Moldes, que decorreu no Centro Empresarial da Marinha Grande.
Na sua perspetiva, por enfrentar “desafios e ter restrições ao seu crescimento”, o sector “precisa de um particular apoio do Estado”. “Por isso, estamos muito disponíveis para continuarmos esta parceria [com entidades do cluster como a Cefamol], para trabalharmos em conjunto para que o sector possa voltar a crescer, mas também adaptar-se a uma realidade muito diferente. Há um conjunto de apoios necessários e que devemos dar num futuro próximo”.
Até porque, como destacou o governante, esta indústria tem particularidades que importa preservar. “O sector de moldes é fortemente competitivo. Portugal é terceiro maior produtor de moldes de injeção de plásticos da Europa e está no “top ten” mundial. E muito poucas indústrias nacionais têm uma posição de ranking como esta, quer dentro da Europa, quer no Mundo”.
A indústria de moldes “tem um posicionamento que vai muito para além da dimensão do país, desde o ponto de vista económico até à sua expressão política no mundo. É a oitava maior do mundo”, destacou Eurico Brilhante Dias, adiantando que, na conjuntura atual, “tem de perceber as oportunidades de crescer, nas diversas áreas, em particular na indústria automóvel em transição”.
Momento de agir
No contexto atual, que aponta para o encurtamento das cadeias de valor, o governante destaca que a indústria “tem condições para ser mais rápida e mais flexível, o que significa mais capacidade de atrair investimento direto estrangeiro e oportunidades de participação nos novos projetos e outros que estiveram parados, em função da pandemia e da transição energética, mas que têm agora as condições para acelerar e Portugal tem de se posicionar para essa procura”.
Para Eurico Brilhante Dias, “este é o momento em que o sector tem de preparar a sua próxima década. A década da mobilidade elétrica, da aeronáutica, da diversificação ou da redução relativa do peso do sector automóvel no conjunto da indústria. São estes os grandes desafios”. “É o momento em que se não agirmos e não tivermos um plano de ação ambicioso ficaremos inexoravelmente para trás”.
A Semana de Moldes 2021 decorreu em simultâneo na Marinha Grande e Oliveira de Azeméis, os dois principais polos nacionais desta indústria, num formato misto online e com algumas sessões presenciais, devido às restrições decorrentes da pandemia. A iniciativa envolveu 1.150 participantes, de diversos países, em conferências, debates, workshops e foi organizada pela Cefamol, Centimfe e Pool-Net.
Pandemia agravou problemas que já afetavam a indústria
O presidente da Associação Nacional da Indústria de Moldes (Cefamol), João Faustino, destacou na sua intervenção o “impacto da pandemia”, que “foi profundo, quer no sector, quer nos mercados que serve”.
A pandemia “agravou constrangimentos que já vinham a ser sentidos pela indústria, seja ao nível da gestão da instabilidade dos mercados, seja pela indefinição dos novos conceitos de mobilidade, pelas políticas ambientais, pela introdução de novas tecnologias e materiais, seja pela concorrência aguerrida que enfrenta ou pelas exigências mais fortes dos seus clientes”, explicou.
Nos últimos anos, esta indústria tornou-se de capital intensivo, para reforçar a sua competitividade, e o impacto da pandemia “não tem permitido assegurar a continuidade da cobertura do esforço do investimento acelerado realizado”.
“O decréscimo significativo do lançamento de novos projetos, sobretudo na indústria automóvel, ao longo dos últimos dois anos, e que possivelmente se estenderá por mais algum tempo, trouxe também uma significativa redução de encomendas e necessidades acrescidas de financiamento e capitalização para suportar o impacto nas organizações”, refere João Faustino.
Por outro lado, as limitações logísticas e as restrições de viagem condicionaram a atividade normal do sector ao nível da promoção e conquista de novos clientes ou mercados. “Tal situação originou uma redução considerável dos preços de venda, a escassez da oferta, e a escalada dos preços das matérias primas, energia e transportes, gerou uma inflação dos custos de produção, situação que tem limitado a competitividade internacional do sector”, explicou o presidente da Cefamol.
Para enfrentar estes problemas, João Faustino defende, entre outras medidas, que “é pertinente a Europa, através dos fundos concedidos, garantir uma crescente incorporação de valor local, fomentando o encurtamento geográfico das cadeias de fornecimento”.
Sector precisa de mercado e de criar oportunidades
“É preciso transformar as dificuldades que temos tido em oportunidades, que sempre se abrem nestas situações”, considerou o presidente da Câmara da Marinha Grande, Aurélio Ferreira, durante a sessão de encerramento da Semana de Moldes.
“Os problemas da indústria são cíclicos, a história tem-nos contado isso, e tem havido sempre capacidade de reação”, salientou. Mas, para isso, “é preciso ter o empenhamento de todos”. “Precisamos de quê?”, questionou Aurélio Ferreira, respondendo de seguida: “precisamos de mercado e este é o ponto chave. As empresas estão disponíveis para trabalhá-lo, mas precisam de alguma mão do Estado”.
Neste momento, “ninguém vai pedir máquinas ou mão de obra, vai pedir mercado. “Ajudem-nos a chegar aos mercados, ajudem-nos a abrir portas para novos mercados. Este é o caminho que nós precisamos”, disse o autarca, que destacou de seguida a capacidade instalada na Marinha Grande.
“É preciso olhar para toda a tecnologia instalada nas nossas empresas, que é tão boa ou melhor que aquela que existe nos melhores países do mundo – na Suíça, na Alemanha ou no Japão. Em qualquer deles não encontram equipamentos diferentes dos das empresas da Marinha Grande, o que se deve ao mérito dos empreendedores”.
Além disso, “possui mão de obra altamente especializada e cada vez mais vai precisar de pensar nas engenharias, na inovação e ter a capacidade de encontrar nas universidades – e neste aspeto o Politécnico de Leiria pode e deve dar uma grande mão, porque é um parceiro importante – soluções para os desafios que tem para enfrentar”, concluiu o presidente do município.