Um simulacro de incêndio testou hoje a evacuação de uma aldeia de Pedrógão Grande, o primeiro no âmbito da iniciativa “Aldeia segura, pessoas seguras” neste concelho do distrito de Leiria, onde há cinco anos deflagraram fogos que provocaram 66 mortos.
O exercício começou pelas 10 horas com a comunicação da existência de um incêndio à oficial de segurança da aldeia de Picha, Filomena Encarnação, que, de seguida, tocou a rebate o sino da capela, o abrigo da localidade, para onde começaram a afluir os 18 habitantes que ali se encontravam.
Munida de um megafone, Filomena Encarnação pediu insistentemente: “É favor saírem das vossas casas. Temos um fogo perto da nossa aldeia. Por favor, saiam de casa, estamos em perigo. Reúnam-se todos junto à capela”.
Uma moradora de Picha, aldeia poupada pelos incêndios de 17 de junho de 2017, enquanto filma com o telemóvel o desenrolar do simulacro, não consegue esconder as lágrimas. “Embora isto seja uma ficção, pode acontecer na realidade”, afirmou à agência Lusa Ilítia Tomás, de 70 anos, elogiando a iniciativa, “fundamental para que as pessoas estejam esclarecidas dos perigos e para se prevenirem o melhor possível”.
Já depois de “extinto” o incêndio e confirmado que não seria necessário que os moradores fossem transportados para o pavilhão gimnodesportivo da sede do concelho, a zona de concentração e apoio à população, a oficial de segurança “sossegou” os residentes: “Já está tudo bem, o perigo já está passado. Vamos todos para as nossas casas”.
Mas antes do regresso às casas, autoridades e populares – em Picha moram 37 pessoas, mas à hora do “fogo” eram 18 as que estavam – fizeram o balanço do simulacro, ali nas imediações da capela abrigo, onde houve quem lembrasse que “a limpeza à volta da aldeia é fundamental e isso não está a acontecer”.
Outro habitante criticou: “Querem tirar-nos de casa. (…) Se sairmos de nossas casas, elas ardem à vontade”.
Para este morador, “os que têm vontade de ficar nas suas casas, devem poder ficar, para [as] poderem defender”, enquanto outra moradora relatou que há cinco anos, apesar de a Guarda Nacional Republicana ter entrado “escada acima” em sua casa, as pessoas que ali estavam não saíram.
O coordenador da Proteção Civil Municipal de Pedrógão Grande, Rui Alves, reconheceu aos jornalistas haver consciência de que “as populações não querem abandonar as suas habitações”, pelo que admitiu que tem de haver um “trabalho conjunto, além do que ocorreu hoje”, com a Proteção Civil e serviços de Ação Social da autarquia e GNR.
Para Rui Alves, é necessário “fazer ver às pessoas que se se deslocarem das suas habitações elas vão ficar protegidas pelos bombeiros e que podem ir para um local seguro”.
Já o adjunto de comando dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Sérgio Lourenço, assinalou que a maior dificuldade com que os operacionais se debatem em caso de incêndio, “sem ser o combate”, é o facto de “a maior parte das pessoas não querer sair das suas casas”.
Segundo Sérgio Lourenço, este problema resolve-se com outra cultura, sendo que a sensibilização tem de começar nas escolas.
“Outros países do mundo têm essa cultura, evacuar, evacuar, não fica ninguém para trás”, adiantou o adjunto de comando, assumindo que cidadãos estrangeiros residentes na região estão mais sensibilizados para saírem de imediato de casa em caso de fogo.
Da Proteção Civil distrital de Leiria, Alda Lisboa, elencou um conjunto de conselhos, pedindo: “Não podemos pensar que somos sempre os heróis, é muito importante confiarmos em quem tem mais conhecimento, forças de segurança, bombeiros e outros agentes da Proteção Civil”.
O vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande, Luís Correia, desejou que através do simulacro se possa aprender e otimizar os mecanismos de defesa de pessoas e bens, enquanto a presidente da Junta de Pedrógão Grande, Fátima Neves, disse acreditar que exercícios como o de hoje “vão sensibilizando” a população que apresenta renitência.