Do seu ponto de vista, que relevância mantém a imprensa no contexto atual, sendo que estão disseminadas plataformas diversas de comunicação?
Por existirem tantas plataformas de comunicação, através das quais se propaga todo o tipo de informações, a imprensa tornou-se absolutamente indispensável. É o jornalismo que permite distinguir o que é verdadeiro do que é falso, o que é notícia do que é ruído.
Conseguimos imaginar um dia que seja das nossas vidas sem jornalismo? Antever o caos que seria? Ou vamos ser ingénuos e pensar que conseguiríamos sobreviver com as publicações irrelevantes, imprecisas, enviesadas, confusas e mentirosas que vão sendo feitas na internet?
A imprensa é fundamental. Sem ela os cidadãos não conseguiriam lidar com a complexidade daquilo que os rodeia. Sentir-se-iam perdidos, ansiosos, incapazes de orientarem as suas vidas ou de se protegerem em relação a todo o tipo de abusos, incluindo os de poder. Não seriam livres para decidir.
A informação fidedigna satisfaz uma necessidade básica humana. Ajuda a interpretar a realidade, reduz a incerteza, dá sentido ao mundo em que nos movemos. É através dela que identificamos ameaças e oportunidades, amigos e inimigos.
Sem o jornalismo viveríamos em profunda escuridão.
Como avalia a dinâmica da imprensa local e regional e a capacidade de assegurar as atividades informativa e de escrutínio, nomeadamente no que se refere a esta região de Leiria?
Apenas poderei falar pelo Região de Leiria. Face aos recursos e meios de que dispomos, fazemos muito e, nesse sentido, a avaliação é positiva. Os leitores não imaginam as horas de trabalho, o esforço, as angústias, os dissabores que estão por detrás de cada artigo que é publicado, sobretudo os de maior dimensão ou complexidade. Também não imaginam que, com o digital, o trabalho das redações triplicou ou quadruplicou sem que o número de profissionais tivesse acompanhado esse aumento. E que os assuntos são mais complexos, a informação está hoje mais dispersa e se tornou mais difícil de confirmar.
Não quero cair no discurso da vítima, por isso o que digo é que somos permanentemente críticos em relação ao nosso trabalho e insatisfeitos por natureza. Isso, por si só, faz-nos ambicionar e procurar, permanentemente, meios para fazer mais e melhor no sentido de cumprirmos a nossa missão enquanto jornal.
Acredita que a imprensa tem condições para cumprir a sua função com a consolidação do paradigma digital?
Sim, acredito. Mas sem uma política nacional de defesa do jornalismo, consegui-lo-á a muito custo. As pessoas não abandonaram as notícias, abandonaram os formatos e suportes tradicionais e a forma mais textual de apresentar os assuntos. Acompanhar essa mudança é o que hoje está a ser exigido às redações, com a adoção de novas tecnologias e a integração de profissionais com competências que permitam fazer chegar as notícias de forma mais célere, cómoda, inteligível e atrativa aos olhos do leitor. Isso requer investimentos avultadíssimos e uma mudança profunda nas rotinas e nos processos de trabalho das organizações jornalísticas. Se o Estado não intervier no sentido de defender o jornalismo – não a comunicação social -, se os gigantes Google e Facebook não pagarem pelos artigos jornalísticos, se a sociedade não se mobilizar no sentido de defender a imprensa, espera-nos um longo calvário. Será um teste à nossa ética e um enorme desafio à nossa capacidade de adaptação, lucidez e coragem para tomar decisões difíceis. Alguns hão de conseguir. Muitos ficarão pelo caminho ou dedicar-se-ão a atividades que não podem ser apelidadas de jornalismo. O deserto de notícias será ainda maior.