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Médico responde à entrevista da diretora da Urgência Geral do Centro Hospitalar de Leiria

“Sendo médico de família, sinto-me visado por estas surpreendentes afirmações, falsas e injuriosas”, escreve Rafael Henriques.

Foto do exterior da urgência
Foto de arquivo: Joaquim Dâmaso

Na edição do jornal “Região de Leiria”, de 16/11/2023, em papel e online, a Dra. Paula Helena Silva, diretora do Serviço de Urgência do Centro Hospitalar de Leiria, em entrevista, declara que o médico de família (MF) “é um administrativo burocrático”, e que os MF “não veem doentes, eles tratam de papéis porque o mais importante são os indicadores…”, e ainda que “58% do trabalho dos médicos no centro de saúde é dedicado à parte burocrática (…) e só 2 a 3% é que é para tratar situações agudas”.

Sendo MF, sinto-me visado por estas surpreendentes afirmações, falsas e injuriosas. Se de facto, eu e restantes colegas MF, somos sobrecarregados por atividades burocráticas, necessárias e impostas por lei, estas são realizadas em horário não assistencial, isto é, fora do tempo dedicado às consultas e, muitas vezes, em horário extralaboral (de forma não remunerada, diga-se). Dentro do meu horário normal de trabalho, de 40 horas, apenas menos 15% deste (até 6 horas por semana), e de forma insuficiente, é dedicado para, entre outras coisas, trabalho burocrático. O mais importante para qualquer médico, e ainda mais verdade no caso dos MF, é o utente, e não indicadores.

Os indicadores são apenas uma ferramenta através da qual conseguimos avaliar e monitorizar a qualidade do nosso trabalho e implementar medidas de correção, numa perspetiva de melhoria contínua da qualidade dos cuidados de saúde prestados, como retratado em vários estudos, alguns da Associação Nacional de Unidades de Saúde Familiar (USF-AN).

Por fim, no meu horário de trabalho, a carga horária semanal dedicada a tratar de situações agudas, representa 7 horas (17,5% do horário), com 28 vagas. Mais, muitas vezes, e para minimizar a sobrecarga do Serviço de Urgência, e solidariamente, consulto mais utentes agudos, por vezes, além do meu horário. Portanto, os números avançados pela Dra. Paula são, manifestamente, falsos, não sendo referida a fonte ou as referências de que a colega se socorre para citar os números que avançou.

Rafael Henriques
Médico Assistente de Medicina Geral e Familiar
USF Martingil


Secção de comentários

  • VP disse:

    Vereadora Ana Valentin informa que há 22 novos médicos integrados no projeto “Bata Branca” e que poderão começar a cobrir as zonas atualmente descobertas da Bidoeira, Santa Catarina da Serra, Milagres e Regueira de Pontes a partir de 1 de dezembro. Alguns deles também estavam dispostos a trabalhar aos sábados. Boas notícias com um apêndice que deve constituir uma resposta precisa mesmo para quem interpretou mal as palavras da entrevista. “Alguns deles também concordaram em trabalhar aos sábados”…não é complicado, né…?!?

  • VP disse:

    Médicos e/ou Utentes, na entrevista indiciada, alvo de muitas críticas, foram realçados problemas evidentes do “Sistema de Saúde” e não das figuras individuais. Ninguém duvida que todos fazem “bem” o que lhes é pedido, mas penso que em vez de se sentirem “ofendidos” ao olhar para o dedo, talvez fosse bom olhar para a lua. Parece-me que não deve haver dúvidas de que o “Sistema” não é um modelo a ser exportado. Bem como o facto de não ser aceitável que as “Emergências” das estruturas públicas fechem aos fins de semana. Se alguém objetar ao fato de que os médicos (alguns…?!?) fazem o mínimo para o “Público” e depois se envolvem no “Privado”, acho que não deveria ser difícil verificar. Em relação ao “Médico de Família” a minha interpretação é diferente. Continuo convencido de que o que se pretendeu foi que o “Médico de Família” fosse colocado em condições de ser uma parte mais completa de todo o processo de assistência ao paciente, incluindo a avaliação da possível admissão no serviço de urgência, enquanto neste momento isso não está acontecer. Mas não por “responsabilidade” do próprio Médico mas por ineficiências operacionais e organizacionais do “Sistema de Saúde”. Em qualquer caso, uma verdade é absoluta e indiscutível: – quando soldados de um mesmo exército lutam entre si o único resultado possível é a derrota – Trabalhem juntos, trabalhem melhor, acima de tudo trabalhem para o bem das pessoas que depositam em vocês a maior confiança.

  • Carlos Vieira disse:

    Bom dia. A Sr.ª. Dr.ª. DIRETORA da Urgência do Hospital de Leiria, revela uma falta de respeito para com os colegas (médicos de família).
    Não sou médico, mas utente e bem sei o trabalho desenvolvido pelos médicos de família. Deixo uma dica. Como é possível encontrar tantos médicos nos corredores das urgências a conversar, por longos tempos. Certamente a trocar ideias de como medicar os pacientes? Tenho sérias dúvidas.
    Existe um lobby na medicina, intocável. A nossa sorte cidadãos, é às vezes encontrar ótimos profissionais empenhados de corpo e alma. (poucos)

  • VP disse:

    Estou muito surpreso que o que foi expresso na entrevista tenha sido interpretado de forma tão negativa, também porque me pareceu que alguns inegáveis pontos sensíveis​​do Sistema de Saúde Pública foram destacados e foi expressada uma preocupação legítima sobre eles. Claro que tudo pode ser discutido, analisando os detalhes das causas, mas sempre buscando soluções, na crença de “ser parte” do problema e não apenas espectador. Se as urgências dos hospitais públicos encerram aos fins-de-semana, é um problema de todos os médicos, de ninguém excluído, e creio que todos deveriam concordar com isto. Infelizmente, tendo atingido o limite de idade, pertenço àquela geração que via os médicos irem visitar os pacientes em casa a qualquer hora do dia ou da noite, mesmo que apenas por gripe, sem calcular os percentuais de tempo dedicados a fazer isso ou aquilo. Devo dizer que teria preferido ouvir a “uma só voz” falar sobre o envolvimento nos encerramentos de emergência aos fins-de-semana, talvez acrescentando que num período de evidente emergência como o que vivemos hoje, as horas extraordinárias anuais também poderiam ser ultrapassadas com espírito de sacrifício, bem como o horário semanal, para atender às necessidades dos enfermos. Até porque, só para comparar dois “cargos importantes”, se os “Bombeiros” se tivessem perdido nas contas percentuais do seu tempo, talvez Leiria já não existisse por um tempo, como a “Roma de Nerone”. Quem escolhe ser médico não escolhe apenas um emprego ou uma carreira, mesmo que prestigiosa, mas pelo contrário assume uma enorme responsabilidade que por vezes exige uma forte motivação interna, mais forte do que aquela que anima as exigências sindicais e a renovação de contratos. Quem concorda com esses pontos pode ficar tranquilo, não houve menção a ele naquela entrevista.

  • Ana Barros disse:

    Quero expressar o meu total apoio à declaração do Dr. Rafael Henriques, em resposta a entrevista da diretora clinica da urgência do CH Leiria, que no mínimo relela um total desconhecimento da realidade dos CSP e da especialidade de MGF. Ana Barros.

  • Soraia Ribeiro disse:

    Resposta absolutamente necessária. Como médica de família, senti-me totalmente desrespeitada por aquela entrevista. Porque a minha, a nossa, prioridade são sempre os doentes. Quem trabalha como médico de família sabe que os números referidos estão muitíssimo fora da realidade. Realmente deplorável. Obrigada colega, por nos dar voz.

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