O acesso aos serviços de Urgência de Ginecologia e Obstetrícia (SUGO) dos hospitais de Leiria e de Caldas da Rainha passa a estar condicionado a um contacto prévio com a Linha SNS 24 (808 24 24 24) a partir de segunda-feira, 16 de dezembro.
O novo modelo funciona à semelhança do projeto “Ligue antes, salve vidas”, que determina que a referenciação para o hospital decorra de uma pré-triagem através da linha SNS 24/Grávida, do Centro de Orientação de Doentes Urgentes (112), dos cuidados de saúde primários, de outra instituição de saúde pública, privada ou social, com informação clínica assinada por médico ou enfermeiro especialista em saúde materna e infantil ou da urgência geral da mesma instituição de saúde.
Segundo este novo modelo, regulamentado através de uma portaria publicada esta sexta-feira, dia 13, em Diário da República, as utentes que se dirigirem ao SUGO sem referenciação “terão acesso a um telefone e serão aconselhadas a ligar para a linha SNS 24/Grávida, que fará o reencaminhamento para consulta de cuidados primários ou no hospital no prazo máximo de um dia útil”, adianta o Ministério da Saúde em comunicado.
“Se insistirem no atendimento, serão atendidas e triadas por um enfermeiro especialista em saúde materna e infantil”, sendo “encaminhadas para consulta nos cuidados primários ou hospital no prazo máximo de um dia útil”, caso a situação não seja avaliada como urgente.
São exceções contudo os casos que possam constituir “risco iminente de vida” como “perda de consciência, convulsões, dificuldade respiratória, hemorragia abundante, traumatismo grave ou dores muito intensas”.
Ainda segundo a tutela esta reorganização decorre de “um trabalho exclusivamente técnico desenvolvido por especialistas peritos em saúde materno-infantil (Comissão Nacional da Saúde da Mulher, Criança e Adolescente)”, sendo condições de adesão das ULS ao projeto a “criação de uma consulta aberta hospitalar de obstetrícia e ginecologia, em funcionamento todos os dias úteis” e “o agendamento célere de consulta aberta no hospital e nos cuidados primários com garantia de vagas diárias”.
A portaria determina ainda a afixação, à entrada do SUGO, de cartazes com a mensagem “Urgência com pré-triagem telefónica – Apenas atende situações urgentes [com respetivo detalhe] – Antes de entrar por favor ligue: 808 24 24 24”, a colocação de um telefone, e a formação a seguranças e administrativos para aconselhamento às utentes, entre outros pontos.
Na portaria, o Governo lembra que o número de atendimentos diários nas urgências de Obstetrícia e Ginecologia do SNS é “consideravelmente superior” ao dos países do Norte e Centro da Europa, considerando que tal se deve, em grande medida, “à ausência de controlo no acesso à urgência”.
“Este fenómeno resulta do facto de as urgências serem percecionadas pela população como locais de atendimento especializado permanentemente à disposição, com apoio imagiológico e laboratorial completo, sem custos, sendo frequentemente procuradas para aconselhamento de todo o tipo de situações obstétricas e ginecológicas”, acrescenta.
Reconhece que esta oferta alargada e permanente de cuidados especializados, apesar de parecer vantajosa, tem contribuído para o prolongamento de tempos de espera em casos verdadeiramente urgentes, além de colocar uma “pressão insustentável” sobre os recursos humanos, resultando em sobrecarga e situações de rotura nas equipas de saúde, com impactos negativos na qualidade dos cuidados prestados.
Este novo modelo resulta da reorganização dos SUGO que inclui, numa primeira fase, hospitais de 11 Unidades Locais de Saúde (ULS), entre as quais a de Leiria e do Oeste.
O projeto-piloto estende-se ainda aos hospitais de Maria, S. Francisco Xavier, Fernando da Fonseca, Hospital Beatriz Ângelo, Cascais, Vila Franca de Xira, Santarém e Abrantes e à maternidade Alfredo da Costa.
Segundo a tutela, aderiram ainda ao projeto-piloto, de “forma voluntária”, os hospitais de Gaia e de Portalegre e o Centro Materno Infantil do Norte.
“A partir de janeiro de 2025, as ULS da Península de Setúbal (Almada-Seixal, Arco Ribeirinho e Setúbal) irão também aderir”, acrescenta em comunicado, referindo que o modelo, aberto a outras adesões voluntárias, será reavaliado dentro de três meses, sendo objetivo alargá-lo a todo o país.
Oposição do Sindicato Independente dos Médicos
O Sindicato Independente dos Médicos (SIM) manifestou entretanto “total oposição” ao novo modelo de funcionamento das urgências de Ginecologia Obstetrícia, considerando que revela “uma alarmante falta de compromisso” com a segurança das grávidas e dos profissionais de saúde.
Reagindo à portaria publicada esta sexta-feira, o SIM manifesta “a sua profunda preocupação” e reafirma a sua “total oposição” às alterações impostas, apesar de reconhecer “a relevância de medidas que visem organizar e moderar a afluência às urgências”, nomeadamente através de consultas abertas nos hospitais e nos centros de saúde para reencaminhamento de casos que não justifiquem o recurso aos serviços de urgência.
Entre os aspetos do novo regime que considera mais preocupantes, o SIM destaca “a redução das equipas de urgência para níveis inferiores aos atualmente praticados” e “a possibilidade de equipas constituídas por apenas um obstetra especialista, que poderá estar sozinho e ainda com a responsabilidade de supervisão de internos”.
“Estas condições são inaceitáveis e perigosas, desrespeitam os especialistas de Ginecologia e Obstetrícia, degradam as condições de trabalho e incentivam a saída de profissionais do Serviço Nacional de Saúde”, alerta no comunicado citado pela agência Lusa.
O SIM alerta também para “as inevitáveis consequências” desta medida, particularmente “a crescente desmotivação dos médicos, com provável ativação do direito de escusa ao serviço de urgência por parte dos elegíveis”, e rescisões de contratos por parte de médicos especialistas, que não aceitarão trabalhar em “condições inseguras e degradadas”.
Para o sindicato, estas alterações comprometem “as condições de trabalho dos médicos e colocam em causa a segurança e qualidade dos cuidados prestados às utentes”.
O sindicato reitera que “não aceitará quaisquer medidas que comprometam a segurança do ato médico e a integridade física das utentes ou que degradem as condições de trabalho dos médicos”.
Defende também a necessidade de reestruturar os serviços de urgência, “nunca à custa da segurança dos médicos e das grávidas”: reformas fundamentadas em condições de trabalho adequadas e equipas completas devem ser a base de qualquer mudança no sistema de saúde.
O SIM diz que continuará a acompanhar esta questão e não hesitará em denunciar as situações graves que decorrem desta portaria e de tomar as medidas necessárias para proteger os médicos, as grávidas e puérperas de imposições injustas e perigosas
Refere também que instou ainda a Ordem dos Médicos, na pessoa do bastonário e do Conselho Nacional, a clarificar a sua posição sobre a proposta agora publicada, mas ainda não obteve resposta.
“Num tema desta relevância, não podem existir ambiguidades ou distanciamentos”, conclui.