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Lobo Frontal: Ulmar, a frescura da região

A marca Ulmar foi, durante décadas, um grande símbolo de Leiria. Muito dificilmente voltará a existir um projecto empresarial regional, com um contacto tão constante, profundo e alargado junto das populações

poliveira@sistema4.pt

Foi sem pompa nem circunstância que ficámos a saber da derradeira mudança de dono, daquela que foi a maior empresa de distribuição alimentar da zona centro. Este facto até poderia ser considerado absolutamente natural, se esta transação não coincidisse com o fim da presença da marca Ulmar nas ruas da nossa região. É um sinal dos tempos, mas é também uma grande perda. Muito dificilmente voltará a existir um projecto empresarial regional, com um contacto tão constante, profundo e alargado junto das populações. Uma marca com a dimensão do Ulmar não representava apenas um conjunto de lojas alimentares, a sua proximidade acabava também por ter uma função social, quer a montante, quer a jusante da sua actividade.

Na sua maioria, as lojas eram consideradas lojas de bairro, estreitando assim a distância entre os produtores e os consumidores. A penetração social da marca sentia-se igualmente ao nível da presença que tinha em movimentos, associações e projectos sócio-culturais e desportivos.

A marca Ulmar foi, durante décadas, um grande símbolo de Leiria.

O próprio nome, Ulmar, foi a designação dada a uma lagoa próxima de Leiria, que D. Dinis abriu e repartiu pelo povo, em 1291. Até aqui, neste detalhe, podemos encontrar uma curiosa analogia com a actividade desenvolvida cerca de oitocentos anos depois: a distribuição pelas comunidades.

A história dos Supermercados Ulmar teve o seu início em 1969, com as primeiras duas lojas, em Leiria, na Av. Heróis de Angola e na Rua Eng. Duarte Pacheco, aos correios velhos. Um par de anos mais tarde abriu a loja de Pombal, mas o período conturbado do pós-25 de Abril também se fez sentir na empresa, que passou uma década de franca turbulência. Os anos oitenta e a entrada de Portugal na CEE animaram o mercado e permitiram abrir mais uma loja em Leiria e outra em Alcobaça.

Mas foi na década de noventa que se deu a grande expansão da marca, abrindo portas em Fátima, Porto de Mós, Alcanena, Nazaré, Mira d’Aire, Louriçal, Leiria, Caxarias, Condeixa, Vieira de Leiria e duas lojas em Coimbra. Com a entrada no novo milénio, os espaços da Gândara dos Olivais, Fátima e Marinha Grande completaram um conjunto de vinte e três lojas alimentares. Nesta fase, os Supermercados Ulmar chegaram a dar trabalho a mais de quinhentas pessoas.

A “Qualidade e Confiança” eram então a assinatura da marca, mas, em 2007, a venda de todo o negócio ao Grupo GCT, com a mudança de nome das lojas para Ponto Fresco, como que traçou o destino que se veio a confirmar. A forte concorrência, a inadaptação a novas realidades e, seguramente, o afastamento progressivo do “sentir da região” forçaram o declínio e o encerramento de todas as lojas, no início de 2012.

Mas bastou apenas pouco mais de um ano para que cinco antigos funcionários Ulmar, com coragem e determinação, voltassem a reabrir quinze lojas na zona de Leiria. Com a nova assinatura, “A frescura, está de volta”, o projecto, que pretendia recuperar a marca e lançá-la para um novo futuro, acabou por não resistir e, ao fim de quatro anos, a venda à multinacional Spar foi inevitável.

A marca Ulmar acompanhou-me na minha adolescência, e tive a felicidade de poder participar directamente nos dois últimos projectos da sua renovação, em 2000 e em 2013. Esta proximidade permitiu-me assistir ao entusiasmo das administrações e de muitos funcionários, porque fazer parte desta empresa era um grande orgulho. Permitiu-me ver e perceber o imenso trabalho que dá construir uma marca de prestígio, sobretudo no sector alimentar, e os múltiplos factores, as ameaças constantes, os milhares de detalhes, o rigor, a exigência e a energia necessária para que tudo role na perfeição, todos os dias.

Mas foi o carinho e a forma como a comunidade sentia e respeitava a marca Ulmar que me permitiu ver a verdadeira dimensão de todo o trabalho desenvolvido. Afinal, a roseta azul e vermelha já fazia parte de nós, e isso é o que todas as marcas desejam.

 

Nota: Lobo Frontal é um espaço de opinião que pretende partilhar perspectivas pessoais acumuladas nestes mais de vinte e cinco anos de projectos de comunicação e marketing, sobretudo da região, e não tanto como fundamento técnico para uso académico ou profissional.

O autor escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico.