O que ganham as comunidades com o acolhimento de cidadãos estrangeiros?
Ganham tudo. Pode existir um intercâmbio de culturas e um enriquecimento mútuo nas formas de pensar e de estar. Tanto no que se refere a questões mais profundas como às mais simples, como a partilha de hábitos, de diferentes costumes e de tudo o que é a celebração da vida. Pode ser um intercâmbio que nos enriquece culturalmente, sem mudar o que somos e o que as outras pessoas são. É uma troca de experiências, viajamos sem viajar, permite-nos sermos mais tolerantes à diferença e construir caminhos de paz e conciliação.
O facto de sermos um país de emigrantes acarreta-nos mais responsabilidade para acolhermos imigrantes?
Eu não diria que sim por si só. O facto de sermos um país de emigrantes não nos traz mais responsabilidades de acolhimento, mas traz uma expectativa de maior compreensão do que é ser uma pessoa deslocada da sua terra e das suas origens. Por sermos um país de emigrantes, não temos a obrigação de acolher melhor, mas temos a obrigação de saber acolher melhor.
Para além do acolhimento, acha que estamos bem preparados para promover a integração?
Em termos dos índices de acolhimento aos migrantes, somos um dos melhores países. E isso é bom. Mas o acolhimento não está a ser bem feito e Portugal, com alguns desafios e com algumas coisas que podia estar a fazer melhor, mesmo assim, é melhor que quase todos os outros. Há questões no acolhimento. Não me refiro tanto aos migrantes económicos, mas mais aos refugiados e requerentes de asilo. O governo declara sempre intenções de disponibilidade para acolher refugiados, no entanto, na prática, a integração é dificultada por muitas razões. Primeiro porque ouvimos pouco os refugiados e as suas necessidades. Compreendemos pouco as suas necessidades culturais e a necessidade de contactar com as suas famílias que estão nos países de origem e, muitos, em risco. E os processos burocráticos são muito lentos, por várias razões. Mas a vida destas pessoas não pára. E há angústias e expectativas criadas por esta lentidão. O nosso governo optou por uma integração de refugiados que é descentralizada. Mas, na prática, essa boa ideia tem dificuldades de implementação porque não há uma rede comunitária de suporte entre refugiados. Colocamos uma família de sírios numa vila em Portugal, onde não têm mais pessoas das mesmas origens com quem possam estabelecer uma rede de apoio. E às comunidades foi-lhes dado o encargo do acolhimento e integração, mas não lhes foram dadas ferramentas para o fazer da melhor forma.
Como vê o crescimento de movimentos que colocam um rótulo de perigo aos migrantes?
Esses movimentos precisam de um vilão para fazer valer a sua mensagem. Precisam de criar um inimigo para depois se apresentarem como sendo soluções e salvadores. Os migrantes e refugiados são pessoas como nós. Não são criminosos e essa tentativa de colagem tem resultado noutros países, mas é completamente falaciosa e difamatória. É preciso que estejamos vigilantes a este tipo de mensagens que podem apelar aos medos das comunidades. É importante não fazer juízos baseados no medo, no ódio e na falsidade.
Os ‘vistos gold’ contribuem para desvalorizar a componente humana da migração?
Os vistos gold estão a ser uma oportunidade perdida. Muitas pessoas que vêm com os vistos gold não fazem investimento criador de riqueza ou de emprego e não têm a componente de responsabilidade social. Muitos são de pessoas muito ricas que compram casas muito caras e por isso é-lhes dada residência. É preciso perceber de onde vem este dinheiro e como foi conseguido. Há uma componente ética e de prevenção do crime. Há ainda o problema da especulação imobiliária que limita o acesso à habitação
Pedro Neto, diretor da Amnistia Internacional em Portugal aponta vantagens em acolher estrangeiros e os obstáculos que persistem