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Ilustração do rosto de Patrícia Duarte

Patrícia Duarte

Diretora-adjunta do REGIÃO DE LEIRIA

Nós, os velhos

A forma como os mais velhos estão a viver estes dias é um dos lados mais cruéis da pandemia. A par da iminência de contraírem a doença, sofrem com a solidão e o afastamento das famílias.

Desde o início da pandemia, o REGIÃO DE LEIRIA tem dedicado particular atenção à forma como a doença está a evoluir junto da população mais velha, em particular a que se encontra institucionalizada.

São estes os alvos preferidos do vírus que, sem dó nem piedade, entra nos lares de terceira idade e provoca verdadeiras chacinas, como se viu em Espanha.

Por cá, as imagens não são tão dramáticas, mas isso não nos deve descansar. Há residências seniores em que a Covid-19 atingiu a totalidade dos utentes, expondo-os a um cenário de grande incerteza e sofrimento. Conseguimos imaginar como se respira hoje nessas casas?

Esta predileção do vírus pelos mais velhos coloca em evidência a fragilidade em que se encontra essa faixa da população. Tem-nos despertado para a forma como a sociedade os vê. São úteis ou inúteis? Devemos arregaçar as mangas por eles? Que contributo indispensável podem dar? Têm direito a uma cama de hospital? Devem abdicar da vida pelos mais novos?

A entrevista ao general Ramalho Eanes foi, em televisão, um dos momentos mais fortes desta pandemia. Quem tem uma educação militar e um passado de guerra sabe o que, na prática, representa “sacrificar a vida”.

A maior parte de nós não sabe o que isso é. Ninguém se imagina ou foi preparado para “dar a vida” por quem não lhe é nada. Dá-se o que não faz falta, o que não belisca o conforto e a segurança. Não um bem vital e nunca a vida.

As afirmações de Ramalho Eanes são uma lição de coragem e de humanidade que nos deve pôr a refletir. Que modelo de sociedade é este que condena ao martírio uma faixa da população já de si tão martirizada, pelas circunstâncias em que se vê no seu final de vida?

A forma como os mais velhos estão a viver estes dias é um dos lados mais cruéis da pandemia. A par da iminência de contraírem a doença, sofrem com a solidão e a falta de afeto provocadas pelo afastamento das famílias, o distanciamento dos amigos e companheiros de casa, pela  angústia e cansaço espelhados no olhar das funcionárias.

O secretário de Estado da Saúde, António Sales, lançou um apelo ao voluntariado nos lares. Nós, os novos, temos obrigação de agir. É um exemplo de altruísmo e de amor que devemos deixar às crianças. A vida é um ápice. Amanhã, serão elas os novos. Nesse dia, vamos querer que cuidem de nós, os velhos.