A Relação de Coimbra anulou o despedimento por justa causa de um trabalhador de uma empresa de Leiria acusado de assediar sexualmente outros colegas, considerando que o seu comportamento foi “culposo”, mas que não justificava a rescisão contratual.
Em acórdão publicado em meados de maio, o Tribunal da Relação de Coimbra confirmou a decisão que já tinha sido proferida pelo Tribunal do Trabalho de Leiria, que tinha anulado o despedimento por justa causa de um trabalhador acusado de assédio sexual a dois colegas seus e condenado a empresa a uma indemnização em substituição da reintegração no valor de 18 mil euros.
De acordo com o processo consultado pela agência Lusa, foi dado como provado que o trabalhador, em 2021, enquanto responsável pela entrega de fardamento e equipamentos aos funcionários, dirigiu-se a um colega, que experimentava umas calças que lhe ficavam apertadas, e comentou que “os brasileiros têm um peru grande [no Brasil, usa-se o termo para se referir ao pénis]”.
Segundo o processo, o trabalhador terá perguntado ao colega há quanto tempo estava sozinho em Portugal e comentou que deveria precisar de “se aliviar”.
“No final da conversa, [o colega] estendeu a mão ao autor, o qual, ao apertar a mão daquele passou o dedo na palma da mão do mesmo”, com o colega a entender aquele gesto como um “convite para a prática de ato sexual, significado que tem no Brasil”, lê-se.
Também no mesmo ano, ficou provado que terá tocado no seu órgão sexual enquanto olhava para outro colega, que não usava roupa interior enquanto experimentava a farda.
O trabalhador foi alvo de um processo disciplinar aberto em setembro de 2021, que resultou num despedimento por justa causa.
Para a Relação de Coimbra, a empresa não provou “que os comportamentos de cariz sexual por parte do trabalhador” tenham tido “como efeito perturbação ou constrangimento” dos seus colegas, “de modo a afetar-lhes a sua dignidade ou de lhes criar um ambiente intimidativo”.
De acordo com o acórdão consultado pela Lusa, era necessário identificar intenção por parte do trabalhador que tivesse essas consequências ou efeitos.
“O facto de olhar ou de tocar o próprio órgão sexual, sem se apurar o significado de tais condutas, não implica só por si um atentado contra a liberdade do trabalhador. Não se provou que tais atos violassem a sua liberdade sexual, nomeadamente que houvesse o perigo de prática de atos sexuais indesejados posteriormente”, vinca.
Já no caso do outro colega, a troca de palavras ou o gesto na mão não resultam numa intenção específica de teor sexual ou de convite para ato sexual, conclui a Relação de Coimbra.
“Os atos e palavras do autor, dados por provados, podem ferir a moral/pudor (sempre levados ao extremo) dos trabalhadores em causa, mas nunca poderia resultar a aplicação da sanção disciplinar máxima, o despedimento”, defende, considerando que o comportamento do trabalhador foi “culposo e violador dos deveres de respeito”, mas que o despedimento não é uma sanção proporcional.