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Sociedade

Duas listas disputam liderança da União das Misericórdias pela primeira vez em 20 anos

Manuel Lemos, que concorre a um quinto mandato, defronta António Sérgio Martins, provedor em Pampilhosa da Serra. As duas listas integram representantes de Misericórdias da região de Leiria.

Ato eleitoral decorre esta quarta-feira, dia 6, no Centro João Paulo II, em Fátima

São duas as listas concorrentes à liderança da União das Misericórdias Portuguesas (UMP) para os próximos quatro anos, situação que ocorre pela primeira vez em 20 anos.

A lista A, que tem como mote “Afirmar a força das Misericórdias”, é encabeçada por Manuel Lemos, atual secretário nacional e provedor da Misericórdia de São Roque de Lisboa, e a lista B, com o lema “Devolver a União às Misericórdias”, por António Sérgio Martins, provedor da Pampilhosa da Serra.

A eleição dos novos órgãos sociais da UMP decorre esta quarta-feira, entre as 11 e as 16 horas, no Centro João Paulo II, em Fátima, sendo vários os representantes de Misericórdias da região de Leiria que integram as duas candidaturas.

Pela lista B, que resulta do movimento “Somos todos Misericórdia” de contestação à gestão da atual direção da UMP, concorrem ao secretariado nacional como membros efetivos Fernanda Rosa, provedora da Misericórdia de Fátima-Ourém e Filomena Valente, da Misericórdia de Ansião. Já Paulo Carreira, provedor em Porto de Mós, concorre para o lugar de segundo vice-presidente do Conselho Nacional.

Já pela lista A, candidatam-se Maria da Conceição Pereira, da Misericórdia de Caldas da Rainha, para o lugar de segunda secretária da Assembleia Geral, e Carlos Marques, da Misericórdia de Alcobaça, como suplente no Conselho Fiscal.

Os dois candidatos à direção nacional da UMP concordam em alguns dos problemas, mas diferem nas soluções.

Manuel Lemos, que lidera o organismo há quatro mandatos, assume que aceitou ir a votos “porque houve uma enorme insistência de um número muitíssimo significativo de provedores” que lhe pediram para continuar, depois de verem aparecer uma segunda lista que “não lhes merecia confiança”.

“Achei que valia a pena, até porque vamos viver momentos muito difíceis nos próximos tempos e acredito que a minha experiência e da minha equipa podem ser muito importantes para ajudar as Misericórdias, o setor e as pessoas de quem cuidamos e de quem podemos vir a cuidar”, disse o responsável, em declarações à agência Lusa.

Para o atual presidente da UMP, o principal desafio passa por reforçar o sector social, apontando que o Estado não tem conseguido responder a todos os problemas que se colocam, enquanto o sector social, pela sua flexibilidade e capacidade de adaptação, tem conseguido dar resposta de forma rápida.

Apontou que será um “desafio muito grande” ajudar as pessoas a ultrapassarem a crise atual e disse acreditar que, cada vez mais, a sociedade irá precisar da intervenção das misericórdias.

Deu como exemplo o aumento do salário mínimo para defender que as misericórdias têm de se modernizar e saber dar resposta a novos fenómenos sociais, como é o caso das pessoas que trabalham e são pobres ou do número crescente de imigrantes que chegam ao país e precisam de apoio.

“São, eu diria, problemas velhos vistos de uma forma moderna e diferente, porque o mundo à nossa volta está a mudar e nós não podemos ser velhos”, considerou Manuel Lemos, sublinhando que essa foi a fórmula que fez com que as misericórdias, nos seus mais de 500 anos, “não fossem arrumadas no baú da história”.

Referiu, por outro lado, que a sustentabilidade das instituições é um “problema sério de todos os portugueses”, razão pela qual disse que é preciso exigir do Estado que pague “o preço justo do custo das respostas sociais”.

Relativamente ao facto de haver uma segunda lista a concorrer nestas eleições, Manuel Lemos recusa que isso seja sinónimo de divisão, apontando, no entanto, que se trata de uma equipa com “uma visão diferente”.

“Problema de sustentabilidade do sector”

Já na visão de António Sérgio Martins, a degradação do sector social, e, em particular, das misericórdias, “é evidente” e é preciso perceber a razão por que isso acontece.

Adianta que a “marca misericórdia está ferida de morte” e vaticina que se nada for feito, estas instituições caminham a “passos muito curtos” para o “abismo”, acusando a atual direção nacional de “incoerência”, já que em alguns momentos disse que o Estado pagava o que era preciso e noutros que se não houvesse aumento das comparticipações as misericórdias colapsavam.

Para António Sérgio Martins, essa “falta de coerência” levou a que também o Governo deixasse de acreditar na UMP e propõe-se a trazer para o organismo uma “visão mais moderna e pragmática”, assente em quatro pilares: transparência, previsibilidade, igualdade e proximidade.

Desde logo apontou que é preciso resolver o “problema de sustentabilidade do sector”, dizendo ao Governo, “com coragem”, que tem de pagar pelos serviços prestados, chegando à comparticipação de 50% dos custos.

Em termos de financiamento, defende também que possa vir a ser criada uma lei de financiamento do sector social, que garanta previsibilidade no financiamento estatal.

Traz também propostas para devolução do IVA às misericórdias, benefícios fiscais na compra de carros elétricos ou discriminação positiva no pagamento da taxa social única.

Relativamente à questão da transparência, disse à Lusa não compreender como é que a própria UMP desenvolve respostas sociais e defendeu que seja feita uma revisão “urgente” dos estatutos.

António Sérgio Martins criticou ainda o facto de estas eleições decorrerem a uma quarta-feira, “à hora de almoço”, algo que, segundo o próprio, acontece pela primeira vez, apontando que é “claramente uma tentativa de condicionar” o resultado eleitoral.

A última vez que duas listas disputaram a presidência da UMP ocorreu em 2003. Vítor Melícias derrotou então Lúcia Lousada, sendo reconduzido no cargo para um quinto e último mandato. Segundo informa a edição de novembro da Voz das Misericórdias, o ato eleitoral foi o mais participado da história da UMP, tendo votado 302 misericórdias.

Atualmente, existem 388 misericórdias ativas em Portugal, que apoiam diariamente cerca de 165 mil pessoas e contam com mais de 45 mil trabalhadores diretos, segundo informação disponível no site da UMP.

A União das Misericórdias Portuguesas nasceu em 1976 “para orientar, coordenar, dinamizar e representar as Santas Casas de Misericórdia, defendendo os seus interesses e organizando serviços de interesse comum”.

Tem uma estrutura que integra o secretariado nacional, assembleia geral, conselho nacional, conselho fiscal e secretariados regionais, e os seus estatutos foram revistos em 2014.

A primeira misericórdia fundada em Portugal foi a de Lisboa, em 1498, pela rainha D. Leonor, a partir da qual se disseminou uma rede que hoje está espalhada por todo o território nacional. A mais recente é a Santa Casa da Misericórdia de Quarteira, concelho de Loulé, criada em 2023.

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