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Refundar a Linha do Oeste

Determinante para o futuro da Linha do Oeste será uma nova amarração a sul, a Lisboa, e não a norte, cuja importância é relativa.

Carlos M. S. Miguel, presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras

1873

“Em 13 de Março de 1870 foi inaugurada em Portugal a primeira linha deste tipo, ligando Lisboa ao Lumiar. A 27 de Fevereiro de 1872 a sua exploração foi concedida à inglesa Companhia lisbonense a vapor por trilhos, limitada que, aumentando o seu capital, construiu duas novas linhas, uma para Sintra e outra para Torres Vedras, sendo esta última inaugurada a 4 de Setembro de 1873.

Esta viagem iniciou-se às 6 horas e 25 minutos … e chegou a Torres Vedras às 10 horas e 45 minutos, tendo efetuado uma longa paragem em Freixofeira, onde um dos mais abastados lavradores da região ofereceu uma lauta merenda a todos os passageiros”.

Este excerto foi subtraído ao livro “O Caminho de Ferro em Torres Vedras – Impacto da sua Chegada”, do meu amigo e ilustre historiador, Venerando Aspra de Matos, o qual, estando cheio de preciosidades narrativas que ilustram a realidade à época, o mesmo mantém-se muito atual, volvidos que estão 139 anos.

Na verdade, se em 1872 demorava-se 4h e 20m para ir de Lisboa a Torres Vedras, incluindo uma “… lauta merenda”, na mesma altura esse trajeto efetuado por diligência fazia-se em 6 ou 7 horas.

Daí para cá tudo se alterou ou, pelo menos, uma parte alterou-se.

2012

De comboio deixámos de demorar 4h20m para ir de Torres Vedras a Lisboa, pois fazemos esse trajeto em cerca de 1h30m. Mas de diligência, agora autocarro, a viagem já não se faz em 6h ou 7h para se fazer em 40 minutos.

Isto é, se o comboio reduziu o seu tempo de trajeto para 1/3 (mas sem refeição), a camioneta reduziu esse mesmo tempo de trajeto para 1/9, relativamente a 1873.

Explicação para tal desproporção reside em dois fatores determinantes: tecnologia e investimento.

As infraestruturas viárias têm tido um incremento, uma atualização constante e permanente, enquanto as infraestruturas ferroviárias, no que à Linha do Oeste respeita, continuam como no final do século XIX.

O mesmo se pode dizer quanto ao material circulante e o que isso representa para a velocidade, a comodidade e a atratibilidade dos passageiros, onde a diferença entre os dois meios de transporte é gritante, onde nem a simples eletrificação da linha chegou ao Oeste e a única alteração que se notou nestes 139 anos foi a substituição do vapor pelo gasóleo, como força propulsora das locomotivas.

Para que não se desculpe sempre com a falta de tráfego, é importante escalpelizar, ao dia de hoje, qual a oferta destes dois meios de transporte para o cidadão comum e a natural adesão destes a cada um destes meios de transporte.

Diariamente, entre as 07H00 e as 10H00 de Torres Vedras para Lisboa partem 22(!) camionetas diretas, com intervalos entre os 5 e os 10 minutos e que demoram 40 minutos a chegar ao Campo Grande, pagando o utente por uma viagem € 5,40.

Para o mesmo período horário a CP dispõe de 3 automotoras, que demoram 1H30m a chegar a Entrecampos, pagando o utente € 5,95 ou € 7,55.

Palavras para quê?… Os números falam por si e se as coisas estão como estão, não é por falta de utentes, caso assim fosse não havia tantas camionetas, mas tão só por falta de estratégia, visão e investimento.

2028

Que me perdoem alguns Colegas por não comungar com a sua opinião mas, felizmente, os delitos de opinião não são condenáveis nem censuráveis em Portugal.

Continuo a entender e a acreditar que o futuro da Linha do Oeste está a sul e não a norte.

Quero com isto dizer que o trajeto da Linha do Oeste a norte de Torres Vedras e a sua amarração à Figueira da Foz ou a Coimbra é importante mas não é determinante para o seu futuro e para a sua rentável exploração económica.

Determinante será a sua futura amarração a Lisboa, permitindo um acesso fácil, cómodo e rápido ao centro da Capital que sirva as pessoas do Oeste, nomeadamente de Caldas da Rainha, Bombarral, Torres Vedras e Malveira, constituindo uma verdadeira via de escoamento dos nossos produtos para a Europa e o mundo, por via ferroviária ou marítima.

Para tanto há que tornar a linha competitiva e verdadeira concorrente ao transporte rodoviário, quer de passageiros quer de mercadorias, tornando tudo mais equilibrado e interdependente.

Quem sabe o diz e quem observa facilmente o vê que tal só é possível alterando o traçado da Linha do Oeste, na sua chegada a Lisboa, reduzindo o trajeto e aumentando a comodidade.

Atualmente, como em 1873, a linha no seu trajeto norte para sul, tem um traçado rectilíneo entre as Caldas da Rainha e a Malveira. Porém, a partir da Malveira, o seu traçado em vez de fletir para Este em direção a Lisboa, flete para Oeste, afasta-se de Lisboa para parar no Cacém, onde encontra a linha mais sobrecarregada do país, a Linha de Sintra, onde os oestinos fazem transbordo ou aguardam vez para entrar na linha e as mercadorias estacionam e desesperam.

É, essencialmente, por esta circunstância de trajeto, de traçado da linha, que a viagem Torres Vedras – Lisboa demora 90 minutos e não os 40 minutos do autocarro.

Solução?

Necessariamente REFUNDIR a Linha do Oeste, criando um novo traçado a partir da Malveira, que vá servir a população de Loures, a qual não está servida de ferrovia, entrando diretamente em Lisboa, chegando à “Estação do Oriente” ou ao espaço do atual “Aeroporto da Portela”, se o mesmo no futuro vier a ser uma nova central de mobilidade da capital, como já se falou.

Com esta solução teríamos os passageiros do Oeste e para o Oeste, servidos por um transporte competitivo em matéria de tempo de percurso, com toda a comodidade própria dos comboios e as mercadorias passariam a ter um acesso fácil à margem sul do Tejo, pela nova ponte em projeto, independentemente do seu destino ser a Europa pela ferrovia ou a América ou Ásia via porto de Sines.

Diga-se desde já que esta hipótese não é uma utopia nem uma novidade, pois a mesma foi estudada e até um corredor marcado, era então primeiro-ministro o Prof. Anibal Cavaco Silva, sendo Ministro das Obras Públicas o Eng. Ferreira do Amaral.

Todos temos consciência que não é uma solução simples, fácil, nem barata, mas estou convicto que esta é a solução e, sendo a solução, mais vale procurar a oportunidade, elaborar projeto integrado e executá-lo a longo prazo, talvez para 2028, altura em que se evocará os 175 anos da Linha do Oeste.

Andarmos com soluções de mesa de café, que nada resolvem, tudo adiam e o dinheiro acaba por se gastar, não é solução para ninguém.

É preferível esperar para ganhar.

Até porque “o barato sai caro”.

O Oeste precisa da Linha do Oeste e esta será determinante para o Oeste, mas a Linha do Oeste não precisa de uma reformulação, para viver e ser viva ela terá que ser refundada.