Há uns meses falei aqui do meu pai. Alguns de vocês que me leem pressentiram o que eu vivia: eu sentia que o tempo nos escorria por entre os dedos e precisava de aproveitar todos os momentos. Assim foi. Fomos a tempo.
Pois o meu pai despediu-se. Sereno e em paz, não disse adeus, mas partiu. Rapidamente, em casa, rodeado por quem amava. Ainda não volvido um mês, sinto-me dormente, apardalada, mas recuso-me a sentir uma coitadinha.
A verdade é que eu sei que sou uma sortuda por ter tido um pai tão especial. Um pai que me marcou sempre hora de entrada até à meia-noite, mas que aos dezasseis anos permitiu que eu fizesse uma viagem de autocarro, sozinha, para ir conhecer França, o meu país natal; um pai que nunca me deixava ir a discotecas, mas que me incentivou a ir dez dias para Itália quando eu tinha dezassete anos; um pai que não foi além da quarta classe (tirada na tropa como ele gostava de dizer), mas que me deixou abrir asas para eu ir estudar para cento e oitenta quilómetros de casa; um pai que sempre me apoiou e amou incondicionalmente (e eu fui uma filha que dei trabalho).
E é por isto e muito mais que eu, por mais sofrida que esteja, por mais saudades que já tenha, por mais lágrimas que chore, não me sinto infeliz. A gratidão e o amor que eu tenho é tanta que nunca deixariam que fosse de outra maneira.
(texto publicado na edição de 5 de dezembro de 2013)