O anúncio de alterações no sistema de acesso ao ensino superior por parte dos estudantes oriundos dos cursos profissionais gerou o debate do costume. “Facilitismo!”, grita-se, e assim se pretende arrumar o assunto. Convém refletir.
Tradicionalmente acreditava-se que havia apenas um tipo de inteligência e era esta que se valorizava nas escolas. O ensino superior sempre foi elitista, aliás como todo o ensino, e só a partir do século XIX se começou a democratizar ao nível básico, no século XX ao nível secundário, e nos tempos mais recentes o movimento começou a chegar ao superior.
Hoje reconhecem-se e valorizam-se vários tipos de inteligência e a democratização do acesso ao superior é irreversível. Portugal ainda vegeta noutro planeta, infelizmente. Há muito que o acesso deveria ser parte das competências autonómicas dos estabelecimentos de ensino superior e cada um devia poder estabelecer os seus próprios requisitos.
Os cursos profissionais foram criados para responder a necessidades de estudantes mais dotados para atividades que requerem formas mais práticas de inteligência e para cursos indispensáveis ao desenvolvimento do país, mas nunca houve a coragem de levar o processo às últimas consequências. As pessoas não são todas iguais, logo não podem ser sujeitas a processos de recrutamento e seleção iguais. O acesso ao superior não pode ser do mesmo tipo para todos os estudantes.
Os M23 que frequentam o superior são um bom exemplo; os estudantes com médias mais baixas que concluem os cursos em igualdade com os que entram com médias bem mais altas idem. O ensino superior não é para selecionar, nem só para os “melhores”, é para formar com níveis de qualificação mais avançados todos os que queiram e se empenhem e isso consegue-se com trabalho científico e pedagógico, não com medidas discriminatórias.
(Artigo publicado na edição de 12 de março de 2020 do REGIÃO DE LEIRIA)